SENAI Online: Educação ao alcance de todos.
Narradora: Olá, gostaria de dar as boas vindas a você que nos
escuta. Eu sou
a Marcela Miranda, mestra em ciência para o desenvolvimento sustentável e autora do
curso Desvendando a Descarbonização.
Nesse podcast, contamos com a presença ilustre do Professor Tércio Ambrizzi do
Instituto de Astronomia, Geofísica e
Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, o IAG-USP. O Professor Tércio
Ambrizzi tem um vasto currículo, ele é
doutor em Meteorologia pela Universidade de Reading no Reino Unido, é autor
principal de um dos relatórios de mudanças
climáticas regionais, encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente, revisor do
Relatório de Impactos do IPCC e ser
membro titular do Comitê Municipal de Mudanças Climáticas e Eco-Economia da cidade
de São Paulo e membro titular da
Academia Brasileira de Ciências. Professor. É um prazer recebê-lo aqui no podcast.
Convidado: Muito obrigada, Marcela. O prazer é todo meu de estar
aqui com todos vocês.
Narradora: Professor, no decorrer dos anos, está cada vez mais
nítido que as mudanças climáticas têm causado impactos
significativos em todas as esferas da nossa sociedade, não é mesmo?
Convidado: Sem dúvida, cada vez mais nós estamos vendo alterações
nos padrões e na maneira com que o clima costuma
ocorrer. Às vezes você espera um pouco mais, uma estação que tenha mais chuva, outra
que tenha menos. E, no entanto,
muitas vezes a gente tem invertido isso. Portanto, a mudança que estamos
presenciando evidencia que alguma coisa ou nós
estamos colaborando para mudar esse clima de alguma forma.
Narradora: Exatamente. E, professor, é possível vermos esses
impactos no nosso dia a dia?
Convidado: Com certeza. Com certeza. O que, na verdade, o que nós
estamos tratando aqui é o fato da atmosfera estar
ficando cada vez mais quente, e ela fica cada vez mais quente em função do aumento
dos gases, que as pessoas chamam de
gases de efeito estufa, e estufa, aquela coisa que todos conhecem. Eu acho que o
grande exemplo é o carro no sol. Quando
você abre a porta do carro, você vê aquele vapor chegando. É que na verdade o carro
quando fica no sol, os vidros eles
deixam passar o raio solar, que aquece dentro do carro, e depois esse calor ele não
consegue fugir de dentro do carro,
ele fica lá acumulando. É por isso que quando você abre a porta do carro, você sente
aquele bafo quente. Na atmosfera,
ocorre a mesma coisa. Você tem efetivamente um aumento de gases que mantém o calor
da atmosfera e, com isso, se você
começar a aumentar muito esses gases, você diminui aquilo que poderia ser perdido
pro espaço e mantém na Terra. Então a
atmosfera está aquecendo com esse aquecimento, ela está alterando os padrões
meteorológicos do globo inteiro,
particularmente aqui para nós. E com isso você vai sentir. Muitas vezes você sente
que as manhãs estão mais quentes do
que costumava e você muitas vezes não vê, inclusive, aquela chuva, para quem é de
São Paulo, no final da tarde, sempre
tinha um chuvisco... Isso também acabou em função do aumento da temperatura e junto
com a urbanização, que tem feito com
que você altere o clima local. Então, isso é um dos efeitos, um dos outros grandes
efeitos são os eventos extremos que
têm ocorrido. E quando eu falo eventos extremos, é volume de chuva muito grande num
curto período ou falta de chuva em
outros.
Narradora: Muito bom professor, a chamada terra da garoa, que já
não é terra da garoa, mais, né.
Convidado: É exatamente, exatamente, em função da urbanização e
também em função do maior aumento da temperatura na
atmosfera.
Narradora: Professor, e dentro do contexto brasileiro, o senhor já
deu algumas contextualizações aqui, nós podemos
observar no Brasil, qual o impacto que o senhor acha que já é possível das pessoas
observarem no Brasil e possuir uma
causa diretamente ligada às mudanças climáticas?
Convidado: Olha, na verdade isso é até algo meio complicado, só
explicar para todos que um evento que ocorre aqui, hoje
tem ocorrido um monte de chuva. Aí você fala “Nossa, nunca vi tanta chuva na minha
vida assim naquele momento”... Não dá
para atribuir esse evento que ocorreu hoje, exatamente à mudança climática, porque o
clima tem uma variabilidade
natural. No entanto, quando você soma vários desses eventos, você aí vê que existe
uma tendência, ou seja, uma tendência
de ter mais eventos desse tipo de chuvas muito fortes em curto período de tempo, que
são as chuvas que acabam causando
inundações, particularmente nas grandes cidades, onde o fluxo de água tem
dificuldades por causa do solo que não deixa
penetrar, como as calçadas, o asfalto das ruas. Bom, dito isso, o que nós temos
observado em termos globais, mas
particularmente no Brasil? Que esses eventos extremos eles têm sido exacerbados ao
longo desses últimos 20, 30 anos.
Alguns estudos específicos até para a cidade de São Paulo e algumas outras têm
mostrado que não tem chovido mais, mas
tem chovido num curto período de tempo, só que em um volume muito grande. E é
exatamente por causa disso que você acaba
tendo inundações e também acaba prejudicando pessoas que moram em encostas, porque
você pode ter deslizamentos e tudo
mais. Então isso é uma das ações que nós temos observado nas nossas cidades aqui no
Brasil. Por outro lado, apesar de
ter chovido de uma forma concentrada, o que nós temos visto é um espaçamento muito
grande entre uma chuva e outra. Então
choveu um monte hoje e depois vai chover só na outra semana. E tudo isso tem um
impacto muito grande, particularmente na
agricultura. Vamos lembrar que o nosso país é um país agrícola e um dos grandes
produtores de alimentos do mundo e,
portanto, essa variabilidade na chuva, ou chove muito, ou não chove nada, acaba
afetando várias das nossas commodities,
várias das nossas plantações. Isso é um dos fatores que nós temos observado. Um
outro fator é meio que regional, várias
simulações com modelos numéricos, que na verdade simulam como seria o clima se a
gente continuasse fazendo o que nós
estamos fazendo, emitindo esses gases de efeito estufa, e a atmosfera continuasse a
aquecer, o que aconteceria? Então,
esses modelos têm nos dito que, por exemplo, as regiões Norte e Nordeste vão sofrer
um impacto muito grande no volume de
precipitação. Ou seja, há uma probabilidade grande de diminuir as chuvas nessas
regiões de 30 a 40%. Em compensação,
esses mesmos modelos têm indicado que, na região Sul e parte da Sudeste, você teria
um aumento de chuvas nessas regiões,
e o Centro-Oeste fica ali um pouquinho sim, um pouquinho não. Então, na verdade, e
por que isso é importante? Porque
isso afeta demais nós, não só em termos de agricultura, por causa do uso da água,
mas também nós, seres humanos, que
dependemos da água para viver. Então, na verdade, se você não tem os reservatórios
prontos, por exemplo, para segurar
essa variabilidade, você pode ter grandes problemas. Então nós já temos visto isso
de uma forma geral no nosso país, e
obviamente eu não estou citando, mas uma das grandes consequências do aquecimento da
atmosfera é efetivamente o degelo
das calotas polares e também do gelo que fica naquelas montanhas muito altas que
acabam escoando para o oceano e fazendo
com que essa água colabore para aumentar o nível do mar. Se bem que aí eu também
explico para vocês que o nível do mar
ele aumenta muito mais por causa que ele absorve o calor da atmosfera. Então, na
verdade, a gente chama de expansão
térmica, que é aquele princípio da panela de água no fogo, ou seja, quando você
liga, quando ela começa a aquecer, se
você bobear, é capaz que ela transborde. Por quê? Porque ela expande. Não é que você
está gerando mais água ali, não.
Ela está expandindo e, portanto, transborda. Então, às nossas costas, e devemos
lembrar que nosso litoral é muito vasto,
vai desligado praticamente do norte da América do Sul até aqui embaixo, no Rio
Grande do Sul, todo esse litoral poderia
ser afetado com o aumento do nível do mar. Então, são várias as consequências que o
nosso país provavelmente vai sentir
se a temperatura continuar aumentando e nós não fizermos nada nesse sentido.
Narradora: Muito bom professor, passeou aí por todo o Brasil, falou
muito bem desses efeitos que nós podemos sentir no
nosso dia a dia. E você, meu caro ouvinte, o que acabamos de ouvir fica mais
evidente o quanto as mudanças climáticas
afetam a todos e a tudo, e cada vez com mais intensidade e mais frequência. Agradeço
a contribuição do professor e
acredito que ela será fundamental para o nosso estudo.
Convidado: Muito obrigado, Marcela, obrigado pelo convite e espero
que possa contribuir sempre com vocês.
Narradora: Até a próxima!